Na mostra apresentada no Museu de Arte da Pampulha, o coletivo O Grivo, formado por Nelson Soares e Marcos Moreira, apresenta uma série de trabalhos onde “ver e ouvir formam uma unidade”. Articulam-se engenhosidade e obsolescência, dispositivos eletrônicos e artesania, controle e acaso operam-se a serviço da investigação sonora.
Na obra Octeto de Radiolas, O Grivo – MAPo para que a diversidade ruidosa se manifeste. Os mais estranhos sons ecoam no espaço recolhido da pequena sala do museu, onde os objetos suspensos articulam-se em movimentos, falam e calam, alternam sons.
A mesma construção engenhosa parece permear as obras 20 Quadros Sonoros, QuartetoComplexo, 12 Máquinas e Martelo Piano. Nesta maquinaria sonora a dupla de artistas – ou seriam músicos? – aplica métodos emprestados da engenharia onde polias, eixos e engrenagens operam movimentos rotativos transmissores de ação e som. Nesse sistema de peças interligadas, uma vez mais materiais destituídos de sua função original são adotados. Acústicas ou amplificadas por instrumentos eletrônicos, acionadas pelo público ou por timers, essas máquinas sonoras confabulam, a distância ou em aproximação do espectador.
Como 28 gargantas monossilábicas, um coro de 28 caixas acústicas de tamanhos e modelos variados, coletadas de distintas procedências, desgastadas e impregnadas de uso, executam sinais monotonais e cadências geradas por um metrônomo acoplado a um microfone. O andamento musical captado assinala o compasso do tempo e a ressonância no espaço. Apesar da aparente linearidade sonora, percebe-se a tênue pulsação musical, distribuída, uma por uma, 28 vezes. O tempo parece ser a questão nuclear dessa obra e escoa agonizante pelas caixas espalhadas no chão do Museu. “O tempo eterno torna-se terno, ou melhor, terreno. Da terra, medido, contado e pesado.” (Walter Smetak)
A reminiscente impregnação sonora é recuperada no trabalho 8, instalado no antigo grill do Cassino da Pampulha, datado de 1942, outrora espaço cênico de baile e música. Silenciosa, a plenitude da arquitetura modernista desabitada é agora ocupada por apenas oito caixas acústicas interconectadas e instaladas em circularidade sonora a ecoar uma peça musical. Aqui não há, diferente das outras obras apresentadas na mostra, qualquer aderência de materiais e questões volumétricas, a despeito dos elementos arquitetônicos presentes. À espera do espectador, todo o espaço está per- meado apenas da experiência sonora e da espacialização acústica que se completam com o deslocamento do passante.
Próximo das “plásticas sonoras” , instrumentos-esculturas construídos pelo músico e compositor Walter Smetak, O Grivo elabora na peça Piano Mecânico seis pequenas engenhocas munidas com captadores de áudio, onde sinais gravados de teclas de piano de brinquedo são percutidos desordenadamente pelas engrenagens e dis- tribuídos entre o sistema de som.
Nas articulações imprevistas,1sonoras e espaciais propostas pelo O Grivo, as informações auditivas e visuais de rotina são alteradas e impregnam-se de experiências tocadas pela imaginação. Reverberam inquietações para além dos nossos ouvidos…
Marconi Drummond (Curador) | Fabíola Moulin (Coordenadora de Artes Visuais)
Walter Smetak (1913/1984) foi instrumentista, compositor e professor na Universidade Federal da Bahia, onde durante 12 anos realizou pesquisas de som e criou mais de 100 instrumentos musicais, utilizando materiais não convencionais como cabaças, plástico, isopor e bobinas.